Éramos tais e quais os dois países, entre eles o rio e entre nós os desencontros cruéis que separam os verdadeiros sentimentos e que no entanto unem vidas a eternidade, ainda bem que é assim.
Por um momento paralisei aquela visão em minha mente, precisava deste instante para lembrar-me do que significa o longe quando uma barreira traiçoeira e invisível separa o que logo estaria ali se fizéssemos um simples gesto de esticar os braços e estabelecer elos coerentes com a capacidade de doação que por certo se insere em qualquer ser humano, no entanto isso parecia tão inacreditavelmente impossível.
Sob que estados se abriga os gestos que norteiam formas saudáveis de se relacionar? Há uma carência instalada no mundo inteiro e no entanto as pessoas insistem em modelos tradicionais de travar relações. Estes e tantos questionamentos viajavam em minha mente, mais ainda naquele momento em que havia a intensa busca incessante de entender os caminhos da vida.
Nunca saberei descrever com fidelidade o que se passava naquele instante. Todo o meu ser comungava com a paisagem ao redor. Havia em volta de tudo isso um halo de tristeza num pacto mórbido com algo que corroía as entranhas.
O barco avançava tão lento sobre um rio que naquele exato lugar nunca seria mar, da mesma forma que minha busca, ele seria sempre parte de um todo, mas nunca o que deveria ser pleno e inteiro.
A água era pesada , negra e encrespada tal qual a minha forma de entender certas atitudes e fatos.
Estávamos de mãos dadas eu , o desalento e uma tristeza tal qual o voar lento e circular das gaivotas. Havia um canto silencioso no horizonte, acordes ao relento, melodia que por certo não encontrou ainda todas as notas necessárias para imprimir uma junção de sons harmoniosos e audíveis ao que se diz ouvidos sensíveis. Quem sabe há uma imperfeição qualquer no nosso organismo que nos torna incapazes de metabolizar determinadas emoções.
Que fazer? Há momentos em que nos perdemos e somos pura e simplesmente uma forma qualquer em que morfologicamente abrigamos um ser num desalento tal , que nos surpreende a capacidade vital que por ventura ainda possa acenar com sinais de que ali existe qualquer vida.
Nestes instantes não há passado, o presente é um desenrolar cambaleante de instantes que nos desequilibram a própria existência e o futuro é algo impossível de desenhar. O que se foi é um borrão sujo na memória, e deixa o presente incerto, ficamos por assim dizer sem o chão que nos abriga os pés.
Faltam as cores, faltam os sons , rabiscos de sonhos entorpecidos pelo acordar compulsivo do que se chama realidade , do que se diz racional.
Há guerras que se travam em silêncio, onde deveriam haver palavras surgem feridas tais que não ousamos sequer traduzir as dores por serem elas indescritíveis.
Inesquecível ver sonhos morrerem, castelos de areias ruírem , lamentos da alma abrigados na escuridão do mundo, espasmos de vida sucumbindo frente a covardia de alguns.
Aromas que exalam uma podridão tal que nos é impossível respirar sem que algo mortal nos risque a alma.
E tantas coisas que poderia falar , mas agora, o rio é passado, é preciso respirar fundo e subir a encosta do que se chama esquecimento.
Invadia- me na alma o vento frio, era tudo tão frio, tão gélido e tão mórbido que por momentos excomunguei a fé no Deus que tanto acredito e que me faz viver, varo os dias a entender o porque de estar aqui neste mundo onde os laços com a vida são tão frágeis.
Quem sabe aprenda a escrever com digitais de pedra estes caminhos...
(DA MINHA QUERIDA AMIGA BRASILEIRA)
© Clivânia Teixeira